Já lá vão 700 posts, e para comemorar o número redondo, falarei de uma das melhores telenovelas de sempre, Roque Santeiro. Uma história carregada com sátira política, com um excelente elenco, que nos deu grandes momentos de televisão, que ainda hoje recordamos com saudade.
Roque Santeiro foi escrita por Aguinaldo Silva e Dias Gomes, tendo como base o original do próprio Dias Gomes, “Berço do Herói“. Foi dirigida por Paulo Ubiratan e teve José Wilker à frente de um elenco fantástico de onde se destacaram nomes como Regina Duarte, Lima Duarte ou Armando Bógus, entre outros.
Foi transmitida pela Rede Globo no tradicional horário das 20 horas, entre 24 de Junho de 1985 e 21 Fevereiro de 1986, e foi um sucesso estrondoso de audiências, sendo ainda hoje a novela que mais audiência obteve no canal. O último episódio chegou mesmo aos incríveis 100 pontos e uma média de 95, e em Portugal o sucesso foi igual. Foi transmitida na RTP em 12 Outubro de 1987, numa altura que estávamos a atravessar uma pausa de novelas da Globo, e há já um ano que não era transmitida uma em horário nobre.
A trama conquistou o nosso país, e todas as revistas começaram a abordar assuntos relacionados com a novela (sendo lançada uma que só falava disso), havendo relatos que todos os políticos e pessoas famosas viam e vibravam com a telenovela. Foram lançados calendários pela Impala, cadernetas de cromos foram importadas do Brasil, e as tradicionais k7’s piratas e LP’s com as músicas de Roque Santeiro apareciam um pouco por todo o lado, mostrando a popularidade e força que estava a ter no nosso país.

A banda sonora era fantástica, fez inclusive com que fossem lançados singles no nosso País, de algumas das músicas de maior sucesso presentes na novela.
O Berço do Herói, onde tudo foi baseado, tinha sido censurado em 1963, e já tinha sido tentado ser transformado numa telenovela em 1975, mas que foi também censurada pelo governo após 30 episódios terem sido já gravados. Quando 10 anos depois puderam retornar as gravações, chamaram alguns dos mesmos actores que ou voltaram a interpretar os mesmos papéis (como Lima Duarte) ou passaram para outras personagens (como Milton Gonçalves).
Aguinaldo Silva escreveu a novela a partir do capítulo 41, mas o autor Dias Gomes pediu se podia voltar e escrever os episódios finais voltando assim à trama a partir do episódio 163, e escrevendo até ao 209º episódio com um final à lá Casablanca e que deixou tudo pregado ao pequeno ecrã. Por cá foi repetido o final no dia seguinte, algo que nem sempre acontecia mas que começou a ser algo comum a dada altura.
A história mostra como a pacata cidade (fictícia) de Asa Branca sobrevivia, usando o mito de um homem que morreu para salvar a mesma do perigoso bandido Navalhada. Pessoas começaram a atribuir milagres à sua pessoa, e então foi criada a ilusão de que ele era santo, e os poderes político e económicos da cidade fizeram com que esta dependesse muito dessa ilusão.
O pior foi quando se descobriu que afinal ele não tinha morrido, aquando da sua chegada à cidade prometendo acabar com toda aquela palhaçada. O regresso de Roque Santeiro é feito de forma intensa, com a brilhante música “de volta ao aconchego” (que teve uma versão de Nuno da Câmara Pereira e tudo), abanando completamente todos aqueles que tinham cargos importantes na cidade, e é giro ver como todos ficam abalados com aquilo. Tudo o resto gira mais ou menos em torno daquilo, desde a sua (falsa) viúva à sua eterna namoradinha, desde o Zé das Medalhas ao pobre perfeito que era um banana nas mãos de Sinhozinho Malta e outros poderosos da cidade, desde a malfadada boite da cidade (com um misterioso Lobisomem), a um grupo de artistas que vem rodar um filme sobre o Roque Santeiro.
Ninguém esquece dos momentos de humor entre Viúva Porcina (Regina Duarte) e Sinhôzinho Malta (Lima Duarte) com este a fazer-se de cachorrinho em muitas ocasiões, de como a filha dele (interpretada por Lídia Brondi) sofria com paixão pelo revolucionário Padre Albano (Cláudio Calvacanti) apesar de ter tido flirts com Roque e a personagem de Fábio Jr..
Vemos como o padre Hipólito (Paulo Gracindo) sofre com a abertura da boite de Matilde (Yoná Magalhães) e as beatices de Dona Pombinha (Eloísa Mafalda) que fazia a vida negra também ao seu marido banana, o perfeito Florindo Abelha (Ary Fontoura) que contava com o apoio da sua filha, a virgem Mocinha (Lucinha Lins). Essa sofria com o assédio do professor Astromar (Rui Resende), que foi um dos grandes suspeitos de ser o Lobisomem, um mistério que envolveu a novela a dada altura.
Enfim, foi mesmo uma telenovela fantástica, com um elenco brilhante e músicas extraordinárias a acompanhar uma trama que tinha mistério, humor, romance e drama tudo com as doses certas que nos faziam vibrar e esperarmos ansiosos o próximo capítulo. Tudo sabia o que era “Padre vermelho”, do triângulo amoroso entre Roque-Sinhozinho-Porcina e de como era ganancioso o Zé das Medalhas (fantástica interpretação de Armando Bógus) e como tratava mal a sua doce mulher, ou ainda ver o galã Roberto Mathias (de Fábio Jr.) a fazer suspirar as mulheres da trama e da audiência.
Um sucesso que se repetiu quando a SIC decidiu transmitir a novela em 1993 no horário da tarde, apesar de muitos saberem da história, queriam a rever enquanto que outros viram-na assim pela primeira vez e se maravilharam com a trama como tinha sido no final dos anos 80.