Voltamos às entrevistas, desta feita com Nuno Markl, e nesta primeira parte, vamos saber um pouco mais sobre a série do momento, a 1986.
A RTP tem apostado numa série escrita por Nuno Markl, a sua irmã Ana, e Filipe Homem Fonseca, tendo ainda a colaboração vital de Joana Stichini Vilela. 1986 é uma série que aborda o Portugal dos anos 80, mais concretamente o período das eleições presidenciais que abalaram o país, de Mário Soares vs Freitas do Amaral. Podem ver os episódios todos na internet, na RTP Play, ou irem vendo os episódios todas as terças, pelas 22h no Canal 1.
Existe um disco já editado, em vinil ou cd, e já começa a aparecer um pouco de merchandising relacionado com a série, para além de diversas páginas em sua homenagem. Ficam aqui as oficiais:
https://www.facebook.com/1986TV/ , https://www.instagram.com/1986aserie/
No final ainda podem ver uma foto do autor do Blog, e do autor da série, numa mítica sessão de autógrafos da Caderneta de Cromos no Colombo.
Nesta primeira parte vamos saber um pouco mais sobre a série, enquanto na segunda parte iremos saber um pouco mais sobre o autor e as suas recordações.
Ainda Sou do Tempo – Quando surgiu a ideia para fazer a série 1986?
Nuno Markl – Um embrião da ideia surgiu no início da década de 2000, quando escrevi um esboço de uma sinopse chamado O Videoclube. Era suposto ser uma celebração nostálgica do VHS, e uma história de amor entre um geek e a rapariga que trabalhava no videoclube. Mas acabou por ficar perdida numa pasta no meu computador durante anos. Foi quando achei que seria giro escrever uma série passada em plenas eleições presidenciais que fui repescar esse esboço… E tudo se fundiu alegremente!
AST – Sempre teve a intenção de fazer algo que, para além de retratar a nossa sociedade, fosse um pouco autobiográfica?
NM – Eu sou grande fã da famosa frase “escreve sobre aquilo que conheces”. Achei que 1986 seria tanto mais autêntico quanto mais fosse retirado das minhas memórias, e das memórias da minha irmã Ana, do Filipe Homem Fonseca e da nossa consultora de época, a Joana Stichini Vilela. Por isso o contexto de época era maravilhoso, mas foi instintivo juntarmos à História da era as nossas próprias experiências de família, de escola, de bairro.
AST – O Nuno também viveu intensamente os anos 70, porque começar este trabalho a meio da década de 80? Pela importância da eleição presidencial?
NM – Decidi começar por 86 pela força do enquadramento das Presidenciais. Foi um acontecimento tão forte e que mexeu tanto nas próprias relações entre as pessoas, que ajudou a focar a narrativa e a não a tornar apenas um repositório desconexo de memórias dos anos 80. As Presidenciais deixam muitas destas personagens com os nervos em franja, e isso é óptimo para a comédia e para o drama da coisa.

AST – O elenco tem encarnado na perfeição o espírito da década, alguns exageros caricaturais em algumas personagens são intencionais, ou foi um processo orgânico na própria representação? (o exemplo da gótica por exemplo)
NM – O histrionismo das personagens dos pais, o Eduardo e o Fernando, é intencional. A nossa ideia é que eles fossem consideravelmente mais imaturos do que os miúdos, isso já estava no guião. O facto deles começarem assim, torna mais interessante a maneira como evoluem ao longo da série e como se vão tornando mais humanos, à medida que vão acontecendo coisas que os vão chamando à Terra. É um grande trabalho do Adriano Carvalho e do Gustavo Vargas. Quanto à Patrícia, por bizarro que pareça, havia miúdas assim na minha escola. Sem darem por isso, pareciam caricaturas de si próprias. Mas, de novo, a Patrícia também tem muito que se lhe diga para lá do aparato exterior. É um belo trabalho da Eva Fisahn, que foi uma daquelas pessoas que escolhemos à primeira. E no casting estava loura – mas a pose, o timing, o olhar… ela era a Patrícia.
AST – Existem planos para segunda temporada? Que eventos podem abordar numa segunda série?
NM – Planos existem, mas não sei se irão tornar-se realidade. A RTP está numa fase de transição, não fazemos ideia se a administração seguinte quer pegar nisto. Sei que a ideia de disponibilizar os 13 episódios na RTP Play foi visionária e vencedora: o culto está a formar-se precisamente por causa disso. Para haver 2a série, suponho que tenhamos de fazer figas para que o fenómeno continue a crescer e as pessoas continuem a ver e a partilhar. Temos algumas linhas narrativas mirabolantes ainda no rescaldo das Presidenciais, mas a ideia é contar uma história no Verão de 86, passada no campismo. E o Verão de 86 foi aquele em que o gelado Calippo apareceu!
